Cronicas Macaenses

Blog-foto-magazine de Rogério P D Luz

A campa de Camilo Pessanha em Macau, e quem são os seus conhecidos descendentes

Campa de Camilo de Almeida Pessanha, no Cemitério de S. Miguel Arcanjo, em Macau. As inscrições em português foram feitas após o falecimento do seu filho João Manuel de Almeida Pessanha, com algumas incorrecções. Foto MV Basílio

A CAMPA DE CAMILO PESSANHA EM MACAU

E QUEM SÃO OS SEUS CONHECIDOS DESCENDENTES

Texto, fotografias e legendas de Manuel V. Basílio

No Cemitério de São Miguel Arcanjo, em Macau, encontra-se uma singela campa, onde repousam os restos mortais de Camilo de Almeida Pessanha, falecido em 1 de Março de 1926 (1), bem como os do seu filho, João Manuel de Almeida Pessanha e, também, da nora, Lei Ói Yông ( 李 愛 容 ). Na laje tumular de granito está gravada uma heráldica, que representa as armas do seu apelido, em que se destaca, designadamente, uma banda serrilhada em ambas as bordas, dentro da qual estão três flores-de-lis.

Além daquela laje tumular, existe também uma lápide, com inscrições em chinês, ali colocada posteriormente. Nessa lápide, estão escritos, no canto inferior esquerdo, os seguintes caracteres chineses: 孫 揚 志偉 加美路 立 , ou seja, 孫 “sün” (neto); 揚 “Yeóng” (apelido resultante da transliteração fonética de “João”) e, nomes, 志偉 “Chi Wâi” e, ainda, os caracteres 加美路 “Ká Mei Lou” (que são a transliteração fonética de “Camilo”). Por baixo do nome está escrito o caracter chinês 立 “láp” (que significa, colocar, erigir, etc.) . Portanto, quem mandou fazer a lápide, com caracteres chineses, foi Camilo João de Almeida Pessanha, neto de Camilo Pessanha, e filho de João Manuel de Almeida Pessanha, com a data de 26 de Julho de 1971 (一九七一年七月廿六日), conforme se acham escritos verticalmente, de cima para baixo, no lado direito da lápide.

Lápide escrita em chinês, datada de 26 de Julho de 1971, que Camilo João de Almeida Pessanha, neto de Camilo de Almeida Pessanha e filho de João Manuel de Almeida Pessanha, mandou fazer. Foto MV Basílio

No cimo da lápide há 3 fotografias: no centro, é a de Camilo Pessanha; a do lado direito, é Lei Ói Yông, mulher de João Manuel de Almeida Pessanha; e, a do lado esquerdo, é o marido dela e nora de Camilo Pessanha.

Os caracteres chineses 先祖 庇山耶 大律師 , escritos mesmo em baixo da fotografia de Camilo Pessanha, querem dizer: 先祖 ”Sin Chou” (avô ou antepassado); 庇山耶 ”Pei Sán Yé” (transliteração do nome chinês de Camilo Pessanha); e, 大律師 “Tai Lôt Si” (Advogado).

Em baixo da fotografia de Lei Ói Yông estão escritos verticalmente os seguintes caracteres chineses: 先母 揚李愛容 , ou seja, 先母 “Sin Mou” (mãe); e, 揚 李愛容 “Yeóng Lei Ói Yông” (a cujo nome foi acrescentado o caracter 揚 “Yeóng”, antes de 李愛容 “Lei Ói Yông”) (2). De notar que o caracter chinês “Yeóng” ( 揚 ) é o apelido adoptado pelo marido, João Manuel de Almeida Pessanha.

A fotografia do lado esquerdo é a do filho de Camilo Pessanha, nascido em 1896, em data incerta (3), cuja mãe era sua concubina, tendo-o perfilhado em 1900 e lhe dado o nome de João Manuel de Almeida Pessanha (4). Em baixo da fotografia, estão escritos verticalmente os seguintes caracteres: 先父 揚公碧珊 (5) , ou seja, 先父 “Sin Fu” (pai); 揚 “Yeóng” (apelido resultante da transliteração fonética de “João”); 公 “Kông” (caracter que se acrescenta a seguir ao apelido para designar o sexo masculino); e, 碧 珊 “Pêk Sán” (transliteração fonética de “Pessanha”) . É curioso verificar que, enquanto Camilo Pessanha adoptou, como seu nome em chinês, 庇 山 耶 (“Pei Sán Yé” , uma transliteração fonética de “Pessanha”), representando “Pei” o seu apelido e “Sán Yé” os restantes nomes, tanto o seu filho como o neto adoptaram um apelido diferente, nos seus nomes em chinês, visto que usaram o caracter 揚 “Yeóng” (uma transliteração fonética muito aproximada de “João”), em vez de 庇 “Pei”.

João Manuel de Almeida Pessanha foi oficial da marinha mercante, casou com a referida Lei Ói Yông (李愛 容), e dessa união nasceu um filho chamado Camilo João de Almeida Pessanha, o referido neto que mandou fazer aquela lápide, escrita em língua chinesa. Além desse filho, teve também uma filha, fruto de uma relação extraconjugal, nascida em 1915, cuja mãe solteira se chamava Francisca Xavier de Sousa do Espírito Santo. Por esse motivo, não deu o apelido Pessanha à filha, Maria Rosa dos Remédios do Espírito Santo. A Maria Rosa casou com Adalberto Manhão, com quem teve uma filha chamada Ana Maria Francisca do Espírito Santo Manhão. A Ana Maria, mais conhecida por Aninha (veja nota de falecimento abaixo), veio a casar com Leonel José Cupertino Onofre Jorge. Por conseguinte, os filhos desse casamento – os Manhão Jorge – são os actuais e conhecidos descendentes de Camilo Pessanha (M.V. Basílio).

Laje tumular, em que se destaca a heráldica da família Pessanha. Foto MV Basílio

Notas:

(1) Camilo Pessanha faleceu na sua residência, para onde se mudou em 1921, localizada na Rua da Praia Grande nº 75 (agora, Avenida da Praia Grande nº 639, onde está instalada a Sucursal Principal do Banco HKSB, no canto do lado direito do Edificio Comercial Si Toi). O funeral realizou-se no dia seguinte e, por sua expressa vontade, foi enterrado civilmente, sem música nem coroas de flores, em campa rasa. Foi J.M.P., ou seja, seu filho João Manuel Pessanha, quem mandou fazer a laje tumular, com a dedicatória À SAUDOSA MEMÓRIA DO POETA.

(2) Os nomes dos chineses são normalmente formados por 3 caracteres, sendo o primeiro caracter o apelido, seguido dos restantes nomes. Há também, embora menos frequentes, nomes com 2 caracteres e, ainda, com 4 caracteres, apenas em casos de apelidos duplos.

(3) Consta que nasceu em 21 de Novembro de 1896, tendo sido baptizado no dia 13 de Dezembro, como filho de pais incógnitos, na igreja paroquial de Santo António.

(4) João Manuel de Almeida Pessanha foi perfilhado, em 24 de Agosto de 1900, de acordo com escritura notarial feita na residência de Camilo Pessanha, no Largo de Santo Agostinho, nº 1, em Macau. Foram testemunhas os seus colegas do Liceu, João Pereira Vasco e Mateus António de Lima.

A ilegitimidade parece ser hereditária na família, porquanto Camilo Pessanha era filho natural de Francisco António de Almeida Pessanha, então estudante de Direito em Coimbra, e de sua governanta, Maria do Espírito Santo Duarte Pereira, e o pai de Camilo também era filho ilegítimo de José Benedito de Almeida Pessanha.

(5) Não sabemos se os caracteres chineses 揚 碧 珊 (“Yeóng Pêk Sán”) , escritos para designar o nome de João Manuel de Almeida Pessanha, estão em conformidade com os adoptados pelo próprio João Manuel. O apelido “Yeóng” , usualmente adoptado em apelidos chineses, escreve-se 楊 , e não 揚 , cuja diferença está no radical do caracter, do lado esquerdo. Além disso, 碧 珊 (“Pêk Sán”) são caracteres utilizados em nomes do sexo feminino. Se o nome inscrito na lápide não incluisse o caracter 公 “Kông”, que se acrescenta a seguir ao apelido para designar o sexo masculino, diriam que 揚 碧 珊 (“Yeóng Pêk Sán”) era uma mulher.

(6) A romanização de todos os caracteres chineses é em cantonense, conforme a grafia e pronúncia constantes do Dicionário Chinês-Português, Edição do Governo de Macau.

Uma nota de agradecimento ao amigo Carlos Lemos por esclarecimentos prestados relativamente a Adalberto Manhão, marido de Maria Rosa dos Remédios do Espírito Santo (M.V. Basílio)

Actualização 11/04/2018:

 

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Rogério P. D. Luz, macaense-português de Macau, ex-território português na China, radicado no Brasil por mais de 40 anos. Autor dos sites Projecto Memória Macaense e ImagensDaLuz.

Sobre

O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.

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