(Esta página integra os links do Colóquio sobre a Comunidade Macaense)
Hugo Silva Jr. é natural de Macau e foi um dos oradores no Colóquio sobre a Comunidade Macaense realizado em 27/28/Outubro de 2012. É um dos administradores do grupo no Facebook “Conversa entre a Malta”, também qualificado como Presidente. Eis o que o Hugo falou na sua intervenção:
Meus caros amigos
Quando me endereçaram o convite para proferir umas palavras sobre Identidade Macaense, confesso que fiquei boquiaberto e nervoso sem saber por onde começar. Oiço frequentemente da boca de muitos académicos e estudiosos a falar de Identidade. Mas não pertenço a este universo. Sou um simples funcionário público e bom pai de família. Tive que convocar o meu grupo de amigos a pedir conselhos e ideias.
Procurar saber o que é ser macaense é tão difícil como procurar saber porquê um português não pode viver sem brigar.
Mas não quis esquivar-me ao desafio. Como estou entre a Malta é em jeito de conversa que vou procurar dizer o que me vem na cabeça. Prometo ser o menos sentimental possivel. Vou tentar.
Pois bem, quem somos nós?
A propósito disto, recordo-me de uma conversa com um amigo chinês que me disse isso e me fez seguinte pergunta: “olho para vocês e vejo um com cara de chinês, outro escuro com cara de indiano, outro mais caucasiano, outro ainda com tudo isso à mistura que faz lembrar um filipino ou malaio. Mas todos se dizem Macaenses. Que gente são vocês?”
Entre risos e mais comentários, não consegui responder. Apenas lhe disse que somos mestiços por natureza. De facto que mais podia eu dizer? Ele não iria compreender, nem eu saberia explicar-lhe bem o que está por trás do nosso mundo. Ele não iria compreender o que nos liga uns aos outros.
Ser Macaense, não basta ser de Macau. O chinês, o português, o goês ou o americano que cá nasça não é necessariamente o Macaense com a Identidade de que falamos. O BIR nada nos diz quanto a ele, se não comungar o que é de tão próprio desta terra e da Comunidade.
O Macaense até pode nascer fora de Macau, mas ele encontra-se inelutavelmente ligado a esta terra, quer por laços sanguíneos, quer por qualquer circunstância que evoque sentimentos fortes de pertença a um mundo enraizado em Macau.
Que mundo é esse? A Malta.
Ser Macaense não basta ser de Macau. Tem de ser da Malta.
Ser da Malta é comungar um espaço espiritual e cultural, onde nos comunicamos com uma linguagem, um código de valores, um humor próprios, com regras comummente aceites por todos, um mundo onde se integram elementos de tão grande contraste entre culturas.
O Macaense fala as três línguas ao mesmo tempo. Come Chu Cheong Fan pela manhã e uma bica logo a seguir. Não tem problemas em meter “chouriço-china” no bacalhau com natas. Depois de sair da missa pode ir ter ao mestre fung-soi, ou se precisar, ir ao bate-cabeça no templo chinês para desejar as boas vindos do ano Novo Chinês. Fala um português que é uma incredulidade na Lingua de Camões, mas que faz perfeito sentido em cantonense. Fica aborrecido quando alguém forasteiro se torna abusivo em relação a um chinês e sofre quando a Seleção Portuguêsa leva porrada.
Uma pessoa pode estar em Macau durante décadas e se não é considerado Macaense, não reclame, pois não é da Malta.
Estar na Malta é estar num mundo destes. É aceitá-lo como ele é com todas as suas contradições e fazer dele a sua alma.
É deste caldo que nasce uma Identidade própria que se move ora para o lado português, ora para o chinês, mas que em si é irredutora e inconfundível.
Ora voltando ao meu amigo chinês, não admira que não entenda o que está em causa. Porque ele não é da Malta, onde indivíduos com parecenças tão díspares se sentem ligados uns aos outros, comungam um sentido de estar muito próprio.
Há quem não veja com bons olhos a Malta. Há quem sendo Macaense se envergonhe deste legado cultural que nós somos. “Desta mixórdia” como dizem. Somos uma raça que não é carne nem peixe. Somos mesquinhos e temos reumatismo nos cotovelos. Andamos à porrada à primeira oportunidade. Não precisamos de jormais para as notícas do dia. E como portugueses que também somos, onde estão dois macaenses estão pelo menos três associações.
Mas somos assim e somos incorrigíveis. E se calhar somos felizes assim.
Apesar disso tudo, orgulho-me em ser macaense. Ser macaense é ser único, é ser especial, e não está ao alcance de todos. Afinal, possuimos virtudes que ultrapassam largamente as más coisas que nos atribuem. Não adianta aos que nos quiserem absorver, não somos dissipáveis nem estamos aqui a prazo. O Macaense é oriundo de Macau, e enquanto existir Macau existirá o macaense.
Se Macau é pequeno – e para muitos insignifcante – o Macaense é do tamanho do mundo. A nossa cultura muito própria, a nossa culinária, a nossa música. Nunca se fez tanto em lugar tão pequeno como é Macau. Somos o mais genuíno produto do encontro de duas civilizações enormes, e só podiamos ser mesmo assim, muito grandes.
Podia continuar com mais considerandos, mas vou terminar com o seguinte:
Ser da Malta é ser diferente! Ser Macaense é ser cidadão do Mundo.
Muito obrigado.
Alguns comentários feitos na publicação no grupo “Conversa entre a Malta” do Facebook:
Carlos Freitas: Simplesmente genial Sr. Presidente! Adorei! 😀
Rita Botelho Santos: Foi por isso que disse na altura do Colóquio que a intervenção do Hugo foi a melhor. Definiu a identidade do macaense (que é difícil de definir) utilizando uma linguagem simples que tocava o nosso coração.
Rogério P D Luz, amante de fotografia, residente em São Paulo, Brasil. Natural de Macau (ex-território português na China) e autor do site Projecto Memória Macaense e o site Imagens DaLuz/Velocidade.
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau (ex-território português na China por cerca de 440 anos e devolvida em 20/12/1999) sua história e sua gente.
Macaense – genericamente, a gente de Macau, nativa ou oriunda dos falantes da língua portuguesa, ou de outras origens, vivências e formação que assim se consideram e classificados como tal.
*Autoria de Rogério P.D. Luz,, macaense natural de Macau e residente no Brasil há mais de 40 anos.
Escrita: língua portuguesa mista do Brasil e de Portugal conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
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No Anuário de Macau do ano de 1962, nas páginas finais, vários anúncios publicitários encontravam-se publicados, os quais, reproduzimos abaixo para matar as saudades de quem viveu aquela época de ouro, ou então, para curiosidade daqueles que possam se interessar em conhecer, um pouco mais, aquela Macau de vida simples, sem modernidade, mas, mais humana.
Unir faz força, espero que essa união poderá apoiar nos legítimos direitos das pessoas mais fracas!
Obrigado Jorge pelos respeitáveis comentários
Sejam Macaenses, Chineses, Portugueses ou outras nacionalidade, todos teêm direito a defesa, ninguém pode ser discriminado em razão de ascendência,raça,língua e outros, e são proibidas a injúria, a difamação e acusações falsas, seja qual for a sua forma contra qualquer residente de Macau!
Foi pena nao ter assistido ao coloquio por me encontrar em Taiwan.