Interessante artigo de 1986 da antiga Revista Nam Van a respeito do dialecto indo-português, tendo como enfoque esta palavra “putkipari” oriunda do palavrão bastante usado nos momentos de raiva de muitos, veja:
“PUTKIPARI – RÉSTIAS DE UMA ERA
de Mário Cabral e Sá, em Goa – publicação da Revista Nam Van de Janeiro de 1986
Estávamos a falar de achares e acepipes. E estava uma velha cozinheira goesa a dar o seu veredicto nesta matéria de sua especialidade, dizendo-nos com aquele ar típico de cientista que sabe o que diz e não aceita opinião em contrário, quais os usos os efeitos da malabárica alquimia de pimentas, cravos e canelas. Pimentas, em sua opinião, havia várias: ‘doces’ — vá a contradição — como as de Cachemira; aromáticas como as de Aldonã, aldeia do norte de Goa; picantes mas mesmo picantes… nenhumas tanto como as ‘putkipari‘
PUTKIPARI —estranho vocábulo concanim, língua materna do goês. Mas a etimologia da palavra é relativamente simples. A malagueta goesa (a tal putkipari) é um fruto redondo, à primeira vista uma baga, e um português aventureiro (mas ainda um tanto estranho às ‘coisas da Índia’) teria metido uma na boca para a provar. Ardeu-lhe a boca de certeza… e o homem praguejou: «P… que a pariu».
O ‘nativo’ que presenciou a cena, espalhou logo a notícia: que na língua do branco malagueta era ‘putkipari’. Os portugueses foram -se embora, a malagueta ficou… ou melhor ficou a ‘putkipari’. Passemos em revista alguns vocábulos que, ‘ficaram’ e outros que ‘foram’. Ficaram na Índia — e de um modo geral no Oriente — e foram do Oriente para Portugal — e ingressaram no vocabulário das suas populações um sem número de palavras e expressões. ‘Natal’ é palavra que ingressou no Hindustani. ‘Pagar’ significa vencimento/ordenado em Hindustani, também significa peita/suborno. ‘Purór’, do português por hora significa provisoriamente em Concanim. ‘Sapatu’, é o que ficou do ‘Sapato’ português em terras da Taprobama. ‘Fidalg’ é a expressão contemporânea em Concanim para indivíduo que seja ufano, e, na mesma ordem de ideias, «fidalgui» é vã gabarolice. E ‘barber’ em sentido figurado, é, como aliás o é em português: médico ou cirurgião pouco competente, ‘ Pedrer’ é pedreiro e ‘Sai’ é saia e, ‘corpet’ é soutien…
Poucos haverá que saibam que o ‘pau brasil’ não veio do Brasil. Que Brasil foi assim baptizado porque era rico em cesalpinaceas conhecidas em Português como ‘brasil’ (Cesalpina Sappan).
‘Karpura‘ em Sânscrito, transformou-se em Alconfer em árabe e daí cânfora… ‘Catual’ e ‘quetal’ que em português seiscentista queria dizer comandante de forte, é palavra derivada do Persa kotual, por seu turno derivada de Kota, fortaleza em Sânscrito. Patola, palavra portuguesa significando tecido de seda, veio de Pattuda, palavra da língua Malayalem (do Malabar) e em Goa, em Português goano, patola significa melância.
Da lida com os árabes vieram: alcaide do Árabe al-kaid, e com a vinda dos portugueses a Índia, a palavra alcaide foi assimilada por línguas indianas, tanto de origem Sânscrita como as de origem Familiana. Almirante e almisear, almoxarife e alvará e também armário são igualmente palavras de origem Árabe. Hoje almyrah em Inglês indianizado, almar em em Concani, almari em Hindustani, são o tesouro filológico legado por uma era em que os armários, enormes e pesados, eram usados para guardar rubis de Golconda e pérolas de Pegu. E cartas de amor vindas do Ultramar ou da Metrópole — termos estes que quase já perdemos o seu primitivo significado.
Era uma era de coisa e feitos mirabolantes, palavra esta que no seu sentido contemporâneo significa «que dá muito na vista; espalhafatoso». Tratava-se, originalmente, de um fruto medicinal de Malabar, o mirabolano, que pelos modos muito dava na vista.
Em Damão, os trocadilhos e atropelos são muito mais pitorescos do que em Goa. Regar coração é encher o peito de alegria. Comboio é carret de fogo. E namorado que queira saber se há perigo à vista, pergunta à surrelfa antes de transpor o limiar da namorada: «Tem caz pai?» Ou por outra… está ele a portas dentro?…
Imagem do artigo
Rogério P D Luz, amante de fotografia, residente em São Paulo, Brasil. Natural de Macau (ex-território português na China) e autor do site Projecto Memória Macaense e o site Imagens DaLuz/Velocidade.
Memória - Bandeira do Leal Senado - para nunca ser esquecida -CIDADE DO SANTO NOME DE DEUS DE MACAU, NÃO HÁ OUTRA MAIS LEAL- Esta é a antiga bandeira da cidade de Macau do tempo dos portugueses, e que foi substituída após a devolução para a China em Dezembro de 1999
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau (ex-território português na China por cerca de 440 anos e devolvida em 20/12/1999) sua história e sua gente.
Macaense – genericamente, a gente de Macau, nativa ou oriunda dos falantes da língua portuguesa, ou de outras origens, vivências e formação que assim se consideram e classificados como tal.
*Autoria de Rogério P.D. Luz,, macaense natural de Macau e residente no Brasil há mais de 40 anos.
Escrita: língua portuguesa mista do Brasil e de Portugal conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
cartaz de Ung Vai Meng
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
Hoje, 24 de Junho de 2022, comemora-se 400 anos de “A Maior Derrota dos Holandeses no Oriente” na sua tentativa de tomar Macau dos portugueses. Até a transição de soberania de Macau, de Portugal para a República Popular da China, em 20 de Dezembro de 1999, a data era comemorada como “DIA DE MACAU” ou “DIA DA […]
1 Aqueles bons tempos de Macau, que já não voltam mais, de peças teatrais com participação de macaenses, são recordadas por Jorge Eduardo (Giga) Robarts na sua página no Facebook. Com autorização do Giga, as imagens foram copiadas e editadas, inclusive seus textos. Fazem parte do seu acervo, bem como, partilhadas por seus amigos dessa […]
Nesta postagem, divulgamos duas histórias de Macau de autoria do Manuel V. Basílio, publicadas no Jornal Tribuna de Macau-JTM e que foram extraídas dos seus livros: A primeira viagem portuguesa no sul da China O primeiro acordo sino-português Nos artigos abaixo com os textos com ligação direta no JTM , clique em “continue reading” (continue […]
Comentários