As expressões dos rostos dizem tudo. Tudo era muito simples. Adalberto Remédios, expert no bandolin, “toco à moda antiga” sempre ele dizia orgulhoso, a lembrar aqueles velhos tempos de Macau em que participava das tunas, aproveitou a festa de aniversário da associação macaense de São Paulo e levou o seu fiel companheiro, o bandolin, para matar as saudades com os amigos e conterrâneos.
À sua volta, o Acaio D”Assumpção, Francisco “Xico” Rodrigues e seu antigo companheiro de viola, o “Neco” Clemente Badaraco. Percebam na foto a satisfação dos seus rostos, a ouvir antigas marchas dos carnavais macaenses e das tunas, e também aquelas músicas italianas que tanto amamos. Era uma volta momentânea do bandolin à associação, pois o bandolin silenciou-se em São Paulo. Nenhum macaense mais toca o bandolin. A nossa memória, já andando com uma perna, viu a perda de mais um item.
Adalberto aposentou-se de vez e mudou-se para o Interior de São Paulo, ou seja, para uma cidade menor, mas bem menor, a cerca de 400 km da capital paulista. Levou com o ele o seu famoso bandolin que falava alto nas festas locais, quando fazia parte de um conjunto “à moda antiga”, o Trio Macaense. O bandolin silenciou-se. A música dos velhos tempos de Macau silenciou-se em São Paulo. Não há sucessores. Ninguém mais se interessa pelo instrumento, muito menos pelas velhas marchas. Os tempos são outros. A memória macaense vai morrendo aos poucos.
Inevitável? Pois é! Inevitável, a gente vai envelhecendo e infelizmente a nossa cultura vai envelhecendo junto, e corre o risco de sucumbir conosco, quando chegar a nossa hora. Mas, o Adalberto naquele dia, ainda esboçou um esforço, que poderia dizer que “ainda é possível”. Trouxe com ele, na sua longa viagem de carro, o seu companheiro, o bandolin. E, após o almoço, tirou-o do estojo e logo alguns saudosistas ficaram à sua volta. Um tanto emotivo, a relembrar os velhos tempos, ensaiou uma marchina, Dia da África, que logo despertou expressões de satisfação de quem o cercava. Pena, o seu companheiro de viola, o Badaraco, não sabia que o Adalberto viria à festa com o bandolin, e acabou não trazendo a sua viola. Afinal, não havia nada na programação que previa uma apresentação ou brincadeira musical.
Sentado na mesa ao lado, percebi a movimentação musical e logo apanhei a minha câmera digital e lá se foi o disparo bem na hora exata. Captei as expressões de rosto que a própria foto diz tudo. Na hora não percebi, mas depois em casa é que deu para constatar que fora na hora exata. Logo a cena em si, deu-me um estalo para pensar que, “isto ainda é possível”, a preservação e exaltação da nossa memória. Basta cada um de nós fazer a sua parte. Um pequeno contributo, ou um grande contributo? Tanto faz, o tamanho não tem tanta importância. O importante é o esforço de cada um, qual seja o resultado, se atinge uma pessoa, cinco pessoas, ou milhares de pessoas. Tudo é válido, pois tudo contribui, para somar.
Avaliei o meu caso, e fiquei satisfeito ao ver que faço a minha parte há 7 anos. O Projecto Memória Macaense existe há sete anos. Gostem ou não gostem, ele está aí para tentar divulgar um pouco de nós. “Falar de nós”, como o Jorge Rangel diz nas suas publicações. E não só da gente, mas da nossa cultura e da nossa terra. Assim também, vejo o esforço de muitos da nossa malta a fazer isso, tanto pela parte dos residentes de Macau, como pelos macaenses da diáspora. Os Encontros, as festas que se realizam em Macau, como aquela no São Lázaro, que bonito de se ver, até gostaria estar lá para documentar com a minha máquina fotográfica ou de filmar. Percebo nos residentes um esforço, que poderia até dizer, um tanto mais que dos tempos dos portugueses. Acredito que naquelas épocas, a gente ficava acomodado, pois o governo era da gente e não havia assim tanta preocupação. Hoje não, tudo é uma questão de sobrevivência e de afirmação da nossa identidade.
Faça você como o Adalberto. Alegrou 3 conterrâneos como na foto. Um pequeno número? Sim, mas valeu o esforço, pois mais 100 Adalbertos alegraremos outros 300 conterrâneos e assim por diante. Não é preciso pensar grande, seu pequeno esforço sempre será grande, pois muitos “pequenos” acabam somando de tal forma que fica “grande”. O importante é somar, sempre. Faça a sua parte construtiva para preservação da nossa memória, os nossos costumes, a nossa cultura. Um pequeno esforço tem muito valor. Some !!!
Rogério P D Luz, amante de fotografia, residente em São Paulo, Brasil. Natural de Macau (ex-território português na China) e autor do site Projecto Memória Macaense e o site Imagens DaLuz/Velocidade.
Memória - Bandeira do Leal Senado - para nunca ser esquecida -CIDADE DO SANTO NOME DE DEUS DE MACAU, NÃO HÁ OUTRA MAIS LEAL- Esta é a antiga bandeira da cidade de Macau do tempo dos portugueses, e que foi substituída após a devolução para a China em Dezembro de 1999
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau (ex-território português na China por cerca de 440 anos e devolvida em 20/12/1999) sua história e sua gente.
Macaense – genericamente, a gente de Macau, nativa ou oriunda dos falantes da língua portuguesa, ou de outras origens, vivências e formação que assim se consideram e classificados como tal.
*Autoria de Rogério P.D. Luz,, macaense natural de Macau e residente no Brasil há mais de 40 anos.
Escrita: língua portuguesa mista do Brasil e de Portugal conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
cartaz de Ung Vai Meng
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
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