Luís Gonzaga Gomes no seu livro ‘Curiosidades de Macau Antiga’, editado em 1953, conta sobre Sun-Iât-Sin, ou Sun Yat-Sen (*12/11/1866>+12/03/1925), um dos mais importantes personagens da história contemporânea da China, e o seu memorial em Macau.
Padre Manuel Teixeira, grande historiador, qualificava o autor do livro “Luís Gomes foi o melhor e o mais prolífico historiador macaense nestes quatrocentos aos da vida desta terra“. No livro comemorativo “No Centenário de Luís Gonzaga Gomes”, Jorge Rangel assim descrevia sobre a sua pessoa: “Luís Gonzaga Gomes nasceu em Macau no dia 11 de Julho de 1907 e consagrou a vida e o talento a um fecundo e intenso labor intelectual, até que o morte o levou em Março de 1976“.
SUN-IAT-SIN EM MACAU
do livro CURIOSIDADES DE MACAU ANTIGA de autoria de LUÍS GONZAGA GOMES
editor Notícias de Macau – 1953 (VI – Colecção de Notícias de Macau)
O vulto mais proeminente da história contemporânea da China é, sem dúvida, Sun-Iât-Sin, que os chineses deíficaram, cognominando-o de “Kuók-Fu”, isto é, “pai da nação”, não só por ter ele sido um dos principais fautores da República Chinesa, como ainda pelo facto de ter sacrificado, com modelar abnegação, toda a sua vida, em proveito da grande reforma social, que visava transformar o seu país numa nação próspera o europeizadamente civilizada.
Natural de Tch’ói-Hâng, insignificante vilório que dista apenas uns poucos de quilómetros de Macau, era petiz de treze anos quando partiu para Honolulu, a fim de se juntar a um irmão mais velho que prosperava nessa longínqua “Pérola do Pacífico”.
Após cinco anos de estudos elementares, regressou à terra natal, para seguir pouco depois para Hongkong, onde fez os preparatórios no “Queen’s College” e, em 1892, formou-se brilhantemente no “Medicai College” dessa mesma cidade.
Os ininterruptos vexames impostos pelo estrangeiro à sua pátria, despertaram pouco a pouco, lentamente, no seu ser o espírito de revolta, e não lhe foi difícil ver que o motivo primacial porque o seu país se encontrava debilitado e incapaz de reagir à então desenfreada cupidez dos estranhos, residia na completa inépcia do caquético e anacrónico regime monárquico, totalmente arruinado e enfraquecido pela corrosiva venalidade e pela estulta incompetência de imbecilizados eunucos que eram os que nesse tempo retinham de facto, nas suas mãos, os destinos da nação chinesa.
O malogrado Kuóng-Sôi, jovem e inexperiente monarca, quando subiu ao trono, em 1875, tentara reformar o país. Mal avisado, porém, pelo aliás bem intencionado Hóng-lâu-Uâi, ousou prematuramenta derruir, no curto espaço de cem dias, costumes e leis milenáriamente consuetudinários mas, traído vilmente pelo seu lugar-tenente, Un-Sâi-Hói (Yuan-Shih-Kai)—o maior funâmbulo da política chinesa que, vindo depois a ser Presidente da República, tentou restabelecer a Monarquia, proclamando-se seu imperador,— foi por este entregue à valetudinária e cruel imperatriz reinante que, ao saber que uma das intenções do incauto Kuóng-Sôi era afastá-la definitivamente do trono, não hesitou em repetir um desses actos de tragédia medieval, fazendo sequestrar o malaventurado imperador, durante quarenta longos anos, entre as quatro paredes desprovidas de janelas dum dos pavilhões da Cidade Interdita.
Gorara assim um infortunado tentame cujo desígnio almejava uma drástica reforma do complicado sistema político chinês—a introdução do sistema democrático, no seu aspecto mais liberal possível, em substituição dum absolutismo intransigente e imutàvelmente conservador.
Desfeita a ténue esperança que os espíritos liberais—os verdadeiros patriotas daquela época—mal vislumbraram, não existia outro meio de salvar a nação, que estava caminhando a passos largos para o vórtice, senão escorraçar do mando os odiados eunucos, conselheiros da déspota imperatriz-mãe, e segregar do mando os incompetentes e malversadores mandarins, os sátrapas do sistema monárquico chinês.
Não era fácil lutar contra os interesses dum sistema político que séculos de experiências constituíra em uma admirável organização ; contra uma escola mental, formada por retrógrados letrados que, por se encontrarem obcecados com os obsoletos conceitos filosóficos dos seus cânones clássicos se julgavam possuidores da sabedoria universal, repudiando por isso qualquer idéia inovadora; contra os mandarins, classe privilegiada que retinham o poder e a riqueza; e, contra milhões de indivíduos mal dispostos a ceder o seu modo do vida que supunham irrefragàvelmente o melhor do mundo por outro deles inteiramente desconhecido.
Provocar, pois, uma revolução, num meio tão hostil, era tarefa hercúlea que demandava longos anos de proselitismo para se poder obter algumas probabilidade de êxito.
Estava, porém, lançada a sorte, e Sun-lât-Sin não trepidaria ante nenhuma dificuldade. Impulsivo, dominando fàcilmente quem o ouvia com a magia das suas palavras, principiou a sua campanha de aliciação, organizando uma sociedade secreta que tentou um ataque contra o “Yamen” de Cantão, em 1895. Fracassada a tentativa e acossado pela polícia manchú, o visionário patriota foi obrigado a exilar-se. Fugiu para Hauai, para Londres, para terras diversas, sempre perseguido. Na sua vagabundagem, de cidade em cidade, o seu lúcido espírito não descansava, ia observando, estudando e absorvendo novas idéias que ficariam mais tarde consubstanciadas no “Sám-Mân-Tchü-I” (os Três Princípios do Povo). Em todos os lugares ondo encontrava um núcleo de compatriotas não lhe faltava o apoio moral e financeiro dos mesmos.
Durante esse agitadíssimo período da sua vida, Sun-Iât-‘Sin teve de albergar-se várias vezes em Macau, e, numa ocasião estabeleceu a sua residência e consultório na Rua das Estalagens, no prédio onde hoje se encontra instalada a firma de sedas “U-Tip-P’ât-Tâu”, porventura o primeiro onde a clínica européia foi exercida por um cidadão chinês.
Sun-Iât-Sin, necessitava de se dedicar à, sua profissão de médico, não só para ocultar a sua verdadeira actividade, como para obter recursos, a fim de poder manter-se, tanto a si como aos seus correligionários mais necessitados.
Esse consultório em breve se transformou em refúgio dos mais importantes monarcómanos, tais como: lèong-Hók-Leng, lâu-Lit, Uóng-Hák-Kéong, o mais ardente de todos, lu-Tchéong-Pou e outros.
Pela calada da noite, os conjurados efectuavam o seu corrilho no consultório e aí recebiam as instruções do chefe, e, numa mesma cama, dormiam os lugares-tenentes de Sun-Iât-Sin, quando após horas de truculenta discussão a fadiga os obrigava a descansar.
Como médico, Sun-Iât-Sin era extremamente habilidoso. Entre a sua numerosa clientela, figurava um nevrópata, filho do ricaço Lou, que, minado pela atroz doença que o lançava em constantes ataques de melancolia, depois de ter recorrido sem sucesso algum à ciência dos mais famosos curandeiros da época, só alcançou ser curado por Sun-Iât-Sin.
Grato por quem conseguira restituir a serenidade ao espírito atribulado do seu estremecido filho, Lou-Si ofereceu-lhe um meIhão de oiro, onde estava gravado o eterno testemunho do seu reconhecimento, nos seguintes termos: “São mútuas a sua habilidade e a sua bondade”.
Pouco depois, Sun-Iât-Sin teve de abandonar o seu consultório para ir exercer a sua actividade de revolucionário em outros lugares.
Todos os seu pertences foram então confiados à guarda de Ièong-H’ók-Leng e, quando este morreu, foram entregues aos cuidados da viúva do ricaço Lou-Si.
Entre essas relíquias existia um filtro onde lèong-H’ók-Leng pincelara este conceito ditado pela sua admiração ao caudilho: “Ansioso desígnio tão puro como a água”.
Com o decorrer dos anos, o filtro passou a ser propriedade de Lèong-Im-Mêng, director que foi da Escola Secundária Sông-Sât de Macau, que o ofereceu ao Museu dos Cinco Andares de Cantão, a fim do mesmo poder ser admirado e reverenciado por todos os cantonenses.
No intuito de perpetuar a memória de Sun-Iât-Sin em Macau, Tch’àn-Tchân-U, aliás Tch’ân-Meng-Sü, quando foi escolhido pelo general Tchèong-Kái-Seak para presidente do Governo Provincial de Kuóng-Tông, com sede em Cantão, pensou em adquirir o edifício onde aqui esteve instalado o consultório de Sun-Iât-Sin, a fim de o transformar em um “Pavilhão de Recordação de Tchông-Sán”. Esta idéia, porém, não chegou a vingar porque Tch’àn-Meng-Sü pouco tempo se demorou no poder, em virtude do golpe de estado, provocado em 28 e 29 de Abril de 1931, pelo seu rival o general Tch’àn-Tchái-T’óng, comandante do 8.° Corpo do Exército Nacional Revolucionário.
Em frente do Quartel de Artilharia, na Rua Silva Mendes, existia uma casa que servira de habitação à mulher de Sun-Iât-Sin e que foi destruída no pavoroso desastre da explosão do paiol da Flora, em 1928. Em seu lugar ergue-se hoje um magnífico edifício, em estilo mourisco-modernista, encontrando-se no meio do seu pequeno jardim a estátua de Sun-Iàt-Sin, em bronze e tamanho natural. É nesta casa que o seu filho Sün-Fó, um dos mais importantes vultos da política chinesa, costuma residir, quando de passagem por Macau para a sua aldeia natal.
Rogério P D Luz, amante de fotografia, residente em São Paulo, Brasil. Natural de Macau (ex-território português na China) e autor do site Projecto Memória Macaense e o site Imagens DaLuz/Velocidade.
Memória - Bandeira do Leal Senado - para nunca ser esquecida -CIDADE DO SANTO NOME DE DEUS DE MACAU, NÃO HÁ OUTRA MAIS LEAL- Esta é a antiga bandeira da cidade de Macau do tempo dos portugueses, e que foi substituída após a devolução para a China em Dezembro de 1999
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau (ex-território português na China por cerca de 440 anos e devolvida em 20/12/1999) sua história e sua gente.
Macaense – genericamente, a gente de Macau, nativa ou oriunda dos falantes da língua portuguesa, ou de outras origens, vivências e formação que assim se consideram e classificados como tal.
*Autoria de Rogério P.D. Luz,, macaense natural de Macau e residente no Brasil há mais de 40 anos.
Escrita: língua portuguesa mista do Brasil e de Portugal conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
cartaz de Ung Vai Meng
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
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