Local da antiga loja da Mariazinha, em “pleno centro da Rua das Mariazinhas” na Rua São Domingos, Macau, em 2004.
Caros(as) amigos(as) e visitantes, aqui vai mais contributo do macaense Jorge Basto (Portugal) com um conto que nos leva a um mundo de fantasia em Macau, com detalhes que muito identifica quem morou ou mora nesta cidade do Santo Nome de Deus.
Outras postagens com a assinatura do Jorge podem ser vistas, pesquisando na coluna lateral em: Categorias > Macaenses > Gente > Jorge Basto e clicar sobre o seu nome.
O CASO DA <<RUA DAS MARIAZINHAS>> FINALMENTE DESVENDADO POR SCHERLOCK HOLMES
uma fantasia em Macau
autor: JORGE BASTO (texto e pesquisa de imagens)
Enviado eu, Sherlock Holmes a Macau pela Scotland Yard para resolver esse caso, não criminoso mas social, muitíssimo questionado pela população de Macau mas nunca antes resolvido, chego a Hong Kong depois de muitas carimbadelas no meu «British passport».
Chegado a Macau, desembarco na Ponte Cais no. 16 onde levo com mais uma carimbadela.
Penso logo assim: -Eles desconfiam mesmo de mim, e eu também deles, e aí ponho a minha lógica em campo. Em campo, associei logo… Rua do Campo!
Apanho então um «sam lon tché» (triciclo) para essa rua, cobra-me «um hou chi» (50 avos) e paro, por acaso, frente ao «Lai Kei», uma loja de gelados, talvez por ser verão.
Já agora aproveitei, comprei e lambi um «siut tiu» por «tau leng» (gelado de pauzinho, por 5 avos) pela rua abaixo a pé até ao final, onde à esquerda espero encontrar o Cinema Broadway, conforme as minhas informações confidenciais.
Assim que lá chego, o que? Já mudaram esse nome desde ontem para Cinema Império? Só pode ser para me despistarem. Soube mais tarde que eles em Macau mudam essas coisas dum dia para o outro.
Aqui deparo com uma bifurcação e penso dentro da minha lógica:- Sigo em frente ou viro à direita?
A informação da Scotland Yard dizia-me: -Em frente continuas na mesma rua e chegas a um grande largo de estacionamento totalmente desproporcionado, pois quase não há carros para o encher. Dei apenas uma espreitadela, os carros não estacionavam mesmo lá, e a informação estava toda correcta.
Visto isso, não perdi tempo e viro à direita, graças à minha lógica, «Elementary, my dear Watson!»
Aqui estou a começar a subir pela presumível Rua das Mariazinhas.
Vejo à direita o Hospital de S. Rafael. «My dear, so convenient» aqui mesmo no centro da cidade, pois na minha London tenho que cavalgar muito para chegar a um hospital.
Mais adiante à esquerda vejo ao perto a casa do «Ritchie-pai» que já conhecia, pois lá cogitei tempos atrás sobre alguns casos, enquanto ele me servia nessa varanda do 1o andar, e bem, alguns «scotchs» para me desanuviar da minha lógica quase doentia.
Uf, já cheguei aqui acima e estou cansado. Olhei para a direita e pensei cá comigo: -A subir por aqui acima vou ter ao Monte, e no caminho mora o meu amigo «Inho» Gomes, que me vai por música linda da sua colecção de discos e a mana Margarida servir-me uns «scotchs». Não vou, «trabalho é trabalho», e já aprendi esta frase com os portugueses.
Mas até aqui nada do que vi me convenceu, e continuei em frente.
Ah, agora é tudo plano e penso cá comigo: – O que vale é que com este calor se necessário tenho logo ajuda aqui à esquerda, pois na minha perspicácia vi a tabuleta enorme do consultório médico do «Ritchie-filho». Que sorte ter esses dois amigos, pai-e-filho, que dominam esta zona, tomara eu na minha Scotland Yard.
Olho depois para a direita e vejo uma livraria chinesa e a seguir uma Igreja Baptista, que não me deram pistas nenhumas e estou a ficar preocupado. Caminho mais e pronto, chego então ao Cinema Capitol. Aí outra dúvida, vou ao cinema ou continuo na minha investigação?
Não, é preciso persistir à «british», pois pago 50 avos e ainda por cima lá dentro poupam no ar-condicionado!
Dei mais uns passos já a suar e… não é que descobri mesmo?
«Eureka, my dear Watson»! (esta frase não ficou célebre, mas é também minha).
Isto daqui em diante só pode ser mesmo «o coração» da Rua das Mariazinhas.
À esquerda da rua, uma loja de bordados, rendas, tecidos, perfumes e um sem fim de quinquilharias, onde a «pateloa» se esforçou no melhor português possível para me vender tudo o que estava à vista e não estava à vista. Desconfiei logo…, mesmo sem entender bem esse português.
Dentro da loja, olhando pelo canto do olho, deparei-me com algumas senhoras da sociedade macaense, que logo concluí serem boas freguesas da loja. E logicamente muito bem concluído, pela deferência da patroa, a «torrar» o seu melhor macaense-português!
Não há dúvidas «my dear Watson», esta é mesmo «uma das Mariazinhas», mais as outras patroas das lojas que depois vi aqui ao lado! Não resisti em comprar uma prendinha para levar «à minha patroa».
Resolvido o mistėrio pensei no meu regresso, à minha «England», e nos meus netinhos.
Atravessei a rua, e mesmo em frente entrei na «Mei Mei» para comprar um fatinho para a minha netinha.
Regateei, claro! Foi assim que me ensinaram na Scotland Yard.
Acabei por comprar «ng sam ng sei» (qualquer coisa) por pataca e meia.
Falta o meu netinho. Atravessei outra vez a rua, entrei na loja de brinquedos «Lei Iun Kei» e comprei um carrinho da «Corgi Toys», dizendo «made in England», muito mais «malato» (barato) feito na China.
Confesso, tudo comprado e regateado graças ao pouco cantonense que entretanto aprendi: «Mou kam?, my dear Watson» (esta minha frase de «não há desconto?» também não ficou célebre, mas deu-me muito jeito)
Bem, já não é preciso continuar em frente nesta rua, pois isto vai dar à «Pharmacia Popular». Mais adiante chegaria ao «Solmar», posso encontrar o meu correspondente «Neco» Borralho que me vai querer puxar pela língua e «tchim sai» (assinar tudo) no seu jornal. Não, isto tem de ficar «hou sai séng» (muito bem caladinho).
Como já era hora de almoço, para poupar umas pataquitas (sim, nesse tempo também havia crise), mas éramos «ku hon», (agarradinhos à massa), fui comer um «ho fan» (sopa de fitas de massa de arroz) com «cha siu» (porco fumado às fatias), ali logo na Travessa da Sé. Na montra uma tabuleta dizia «preço fixo», e assim não consegui nem mesmo «kam» (regatear).
Resolvido o «caso da Rua das Mariazinhas», relatei depois ao «my dear Watson».
Muitos anos depois, uns «hackers» descobriram esse relatório e «postaram» na net!
Assinado, pelo bisneto
Sir Conan Doyle.
Nota: Uma fantasia minha sobre Sherlock Holmes, com o devido respeito a Sir Conan Doyle (1859-1930), onde as outras personagens que ele «conheceu» em Macau não são fictícias.
Vai antes mais dedicada ao saudoso Henrique Senna Fernandes (1923-2010), que bem cultivou o humor e a ironia, e em dada altura definiu muito conclusivamente sobre essa Rua:
«Primitivamente, as Mariazinhas limitavam-se ao troço da Rua de S. Domingos, dum e doutro lado da artéria, que vai da embocadura da Travessa da Sé até à subida para a Calçada das Verdades, em frente ao Cinema Capitol. Hoje, o conceito alargou-se, estende-se dum lado à Rua Pedro Nolasco da Silva, a antiga Rua do Hospital, até à Travessa do P. Soares, e doutro lado até ao Largo de S. Domingos.»
(ver em http://caderno-do-oriente.blogspot.pt/2006/06/rua-das-mariazinhas.html)
Jorge Basto
Rogério P D Luz, amante de fotografia, residente em São Paulo, Brasil. Natural de Macau (ex-território português na China) e autor do site Projecto Memória Macaense e o site Imagens DaLuz/Velocidade.
Memória - Bandeira do Leal Senado - para nunca ser esquecida -CIDADE DO SANTO NOME DE DEUS DE MACAU, NÃO HÁ OUTRA MAIS LEAL- Esta é a antiga bandeira da cidade de Macau do tempo dos portugueses, e que foi substituída após a devolução para a China em Dezembro de 1999
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau (ex-território português na China por cerca de 440 anos e devolvida em 20/12/1999) sua história e sua gente.
Macaense – genericamente, a gente de Macau, nativa ou oriunda dos falantes da língua portuguesa, ou de outras origens, vivências e formação que assim se consideram e classificados como tal.
*Autoria de Rogério P.D. Luz,, macaense natural de Macau e residente no Brasil há mais de 40 anos.
Escrita: língua portuguesa mista do Brasil e de Portugal conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
cartaz de Ung Vai Meng
O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.
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Apesar de não ser de Macau, considero a minha segunda terra. Vivi lá 10 bons anos e penso voltar para lá muito em breve, onde já se encontram os meus filhos. Gostei muito de ler o caso da Rua das Mariazinhas. O saudoso Dr. Henrique Senna Fernandes, que ainda tive o prevelégio de o conhecer e que tantos livros nos deixou. Pena Macau já não estar à medida de todas as bolsas, as reformas que hoje recebemos em Portugal já não dá para se viver lá.
Bem haja a quem teve a ideia de publicar este lindo tema e tão bem expressivo com todas estas fotos.