Cronicas Macaenses

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Em Macau, no século XVI, os portugueses eram Feranguis ou Fulanchi

Padre Teixeira no caderno “Primórdios de Macau” faz um relato de como eram chamados os portugueses na China ou na Índia no século XVI, antes da fundação de Macau:

Representação de Chineses, in Jan Huygenvan Linschoten - Itinerario, Amsterdão, 1596 (imagem do livro "Fernão Mendes Pinto e os Mares da China").  Os chineses chamavam os portugueses de fulanchi

Representação de Chineses, in Jan Huygenvan Linschoten – Itinerario, Amsterdão, 1596 (imagem do livro “Fernão Mendes Pinto e os Mares da China”). Os chineses chamavam os portugueses de fulanchi

OS FERANGUIS

O precursor da fundação de Macau foi Leonel de Sousa, capitão-mor de dezassete navios que andou dois anos pelos mares da China (1552-1554). Era natural do Algarve e casado em Chaúl, na Índia. Até ali, os portos da China estavam fechados ao comércio e à navegação portuguesa e os nossos navios eram perseguidos de morte. Apenas se fazia o comércio clandestino e ilegal. Sousa foi avisado,  segundo ele declara numa carta de 15 de Janeiro de 1556, endereçada ao infante D. Luís: “Achei os portos todos cerrados com muita guarda e provimento de armas para nos não deixarem fazer fazenda, nem no-lo consentirem dar; de que fui logo avisado por um china alevantado e de portugueses que lá estavam presos, que estivesse bem apercebido que haviam de pelejar comigo, e que de nenhuma maneira faria fazenda, por que o mandava assim El-Rei, por ser informado que o fazíamos furtadamente, e mandava que toda a geração de mercadores deixassem entrar e pagar direitos, se não aos Franges, que eram homens de corações sujos, que são os portugueses, e os tinham por ladrões e alevantados, que andavam fora da obediência do seu Rei”.

Quer dizer, um pirata chinês e os portugueses cativos em Cantão avisaram-no da situação dos portugueses na China. Permitia-se o comércio às outras nações, por exemplo, aos siameses, aos de Camboja, etc., com a condição de pagarem direitos, mas não aos Franges ou Feranguis. Quem eram os Franges?

Os cristãos eram conhecidos no Próximo Oriente por Franchi, devido à parte preponderante desempenhada pela França nas Cruzadas. Este vocábulo passou à índia e à China. Ora, como os portugueses eram os únicos a navegar por estas paragens, receberam na Índia os nomes de Paranghi, Ferenghi, Ferangui, Firingi, etc. Estes nomes passaram a designar os cristãos, isto é, os portugueses.

Os chineses, que não pronunciam o r, transformaram o vocábulo em fulanchi; ainda no mapa-mundo delineado por Mateus Ricci em 1602, aparece fulanchi no sentido de portugueses. Os chineses chamavam também fulanchi às armas de fogo dos portugueses. Leonel de Sousa adopta o vocábulo da Índia.

Para os chineses, quem eram estes Franges? Eram “corações sujos”, “ladrões” e “alevantados”, isto é, rebeldes. Porquê? Porque, em 1519, Simão de Andrade portou-se como um ferrabrás em Tamão (Lintin), perto de Cantão: não permitiu que os barcos do Sião, Patane, e Camboja carregassem mercadorias antes dele; levantou uma forca e enforcou um marinheiro. Pior que isso: os nossos raptaram algumas crianças chinesas. Portanto, os Franges ou Fulanchi eram “sujos”, “ladrões” e “rebeldes” e não se lhes permitia comerciar na China, fechando-se-lhes os portos e atacando-se os seus navios desde 1519 até 1554.

* O Caderno “Primórdios de Macau” é de autoria de Pe. Manuel Teixeira, editado pelo Instituto Cultural de Macau em 1990. Seria para comemorar o IV Centenário da Cidade do Nome de Deus de Macau em 1986, no entanto as comemorações foram canceladas e o Caderno só foi lançado em 1990.

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Rogério P. D. Luz, macaense-português de Macau, ex-território português na China, radicado no Brasil por mais de 40 anos. Autor dos sites Projecto Memória Macaense e ImagensDaLuz.

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O tema do blog é genérico e fala do Brasil, São Paulo, o mundo, e Macau - ex-colônia portuguesa no Sul da China por cerca de 440 anos e devolvida para a China em 20/12/1999, sua história e sua gente.
Escrita: língua portuguesa escrita/falada no Brasil, mas também mistura e publica o português escrito/falado em Portugal, conforme a postagem, e nem sempre de acordo com a nova ortografia, desculpando-se pelos erros gramaticais.

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